Muitos são os significados que vamos dando ao que está a nossa volta e estes são captados por cinco sentidos que nos permitem perceber o que acontece em nós, nos conectarmos conosco e com nosso meio ambiente – audição, visão, tato, paladar e olfato. Eles são os responsáveis pela capacidade de interpretar os estímulos a nosso redor. Cheiro de fumaça? Algo está queimando. Uma buzina de repente? Opa, cuidado!! Espetada no pé? Pode ser caco de vidro. Vamos desinfetar!!! Cheiro e gosto ruins? Joga fora que estragou. Enfim, nossos sentidos permitem que ações adequadas sejam produzidas.
Entretanto, nem sempre estes sentidos são devidamente estimulados e, quando deixam de ser trabalhados, como se pode esperar que estabeleçamos contatos satisfatórios conosco ou com nosso entorno? Se não ouvi a buzina, nem saí bem rápido do meio da rua, posso ter problemas. Se comi aquele presunto estragado, não sentindo o cheiro e o gosto estranhos, vou passar aperto. Trabalhar os sentidos é trabalhar nossa corporeidade e nossa relação com o mundo que nos cerca.
Analisemos o momento que vivemos. Sofremos agressões constantes e violentas, mesmo que nem sempre nos demos conta disso, especialmente em grandes centros. Mas nosso corpo as registra e responde em forma de tensão, irritabilidade, desatenção, desinteresse, falta de acuidade auditiva ou visual, dessensibilizações diversas, entre outras reações. Barulho permanente, ar poluído, alimentação inadequada, muitos e variados estímulos visuais desordenados, tempo prolongado diante das telas da TV, do celular, do computador, dos videogames. “Metabolizar” este acúmulo de estímulos cobra seu preço, mas o custo será mais alto na proporção do tempo despendido e do maior ou menor desenvolvimento sensorial.
Os sentidos podem sofrer um processo de amortecimento como alerta Yvonne Berge. As constantes agressões sonoras embotam a audição, a percepção auditiva diminui, e a faculdade de escuta diferenciada não se desenvolve convenientemente. Por proteção, vai havendo um fechar-se aos ruídos agressores, mas essa “surdez” voluntária e inconsciente na maioria das vezes permanece mesmo quando cessam tais ruídos. O mais sério é que o barulho torna-se como droga necessária sem a qual o homem moderno não pode passar, mas que dificulta sua concentração ou atenção. O silêncio incomoda, preocupa (há quem só durma com o som da televisão, do MP4, ou dos avisos de que chegou mensagem nova no celular. Também o olfato se perde. A poluição não permite um respirar prazeroso e livre. O ar, que é uma das formas de alimento do ser humano, fonte de energização e equilíbrio, torna-se um causador de problemas. A visão é bastante atingida pela sobrecarga de impressões visuais (movimento excessivo, letreiros luminosos, televisão, cinema, efeitos especiais, …). O tato, então, fica praticamente adormecido, parecendo se restringir às pontas dos dedos. O restante do corpo praticamente não recebe estímulos. O paladar também não se livra das agressões e se torna, muitas vezes, incapaz de apreciar uma alimentação mais sadia e natural, acostumada aos “sabores” da civilização (tudo é regado por mostarda, ketchup ou maionese, e um refrigerante para empurrar tudo isso). Na verdade, ocorre um embotamento da nossa acuidade sensorial.
Os nossos sentidos captam o mundo exterior mesmo que não tenhamos consciência disso. Quantas vezes sentimos uma irritação crescente, sem explicação aparente até que nos damos conta de que a televisão está “gritando”. Falamos mais alto porque o som do trânsito ou da festa não nos permite ouvir a própria voz. E, estudiosos afirmam que a audição é um dos sentidos mais atingidos pelos estímulos externos. Afirmam, ainda, que os sons que nos rodeiam não são percebidos muitas vezes, o que provoca o aumento do nível de tensão e dificuldades de equilíbrio. O ouvido está diretamente ligado à orientação espaciotemporal do corpo, como analisamos no último texto, falando do movimento. O ouvido (sistema vestibular) atua no ajuste do corpo ao seu meio, no seu equilíbrio. Não é à toa que uma labirintite nos tira completamente do eixo.
O ser humano constitui-se pela integralidade de suas partes e todas elas participam do processo de aprendizagem, que passa pelos sentidos, em especial, pela audição, visão e tato. A aprendizagem, seja ela qual for, passa pelo corpo. Toda aquisição de conhecimento tem uma inscrição corporal, que deveria vir sempre acompanhada de sensações de prazer e de estímulo à curiosidade, esta incrível qualidade da criança, que, com muita frequência, é abafada. Na figura que se segue, vemos um ótimo exemplo de estimulação sensorial, as crianças passam por um corredor construído com tubos de pvc com objetos de formas, cores e texturas diferentes pendurados. Ainda há objetos com sons que podem ser experimentados. Elas podem tocá-los, sentir as diferenças, olhás-las e ouvi-las. Também seus corpos são tocados, o que trabalho o tato além das mãos.
O processo escolar da criança deveria dar continuidade ao seu encantamento de aprender; ao deslumbramento que dela toma conta diante das descobertas; à percepção sensorial vívida que a desperta para sabores, aromas, ruídos, imagens, texturas; que faz com que sua curiosidade se aguce e a tome por inteiro; com que pulse alegremente diante do novo – dos sons, das cores, das tramas, dos gestos, das sensações…
Na próxima publicação, daqui a 15 dias, falaremos mais um pouco dos sentidos e do movimento. Até lá!!!
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